quarta-feira, 23 de junho de 2010

As Portas da Percepção / O Céu e o Inferno


Originalmente publicado em dois volumes, As Portas da Percepção (1954) e O Céu e o Inferno (1956) são dos ensaios mais conhecidos de Aldous Huxley (1984-1963), popular romancista autor de livros como Sem Olhos em Gaza, Contraponto, Admirável Mundo Novo e A Ilha. Em As Portas da Percepção, Huxley fez uso do experimento in loco da mescalina para detectar os efeitos da droga sobre o funcionamento do cérebro. O caráter transcendental do trabalho é assumindo desde o título, uma citação (“Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito”) retirado da coletânea de poemas O Casamento entre o Céu e o Inferno, de William Blake.
Chega a ser irônico observar um gentleman inglês como Huxley quebrar tabus e falar com tamanha sobriedade sobre um tema como as drogas. A influência de seu trabalho é notória, tendo se manifestado tanto no campo acadêmico (os experimentos com LSD que fizeram com que Timothy Leary fosse expulso de Harvard), departamentos de segurança do Estado (notórios os estudos conduzidos pela CIA, induzindo cobaias a tomarem doses de variadas drogas afim de observarem seus efeitos), até no campo contracultural (como as excursões de Ken Kesey pela América, com seu ônibus Furthur, realizando testes públicos de ácido, e o livro Cartas do yage, onde os escritores beatnicks William Burroughs e Allen Ginsberg realizam, à sua indiossincrática maneira, um estudo semelhante ao de Huxley, desta vez com o cipó que serve de principal bebida eucarística do Santo Daime).
As conclusões de Huxley, que chega a transcrever trechos de gravações e diálogos em que estivera sob o efeito da droga, são de que “abertas as portas”, a despeito da má fama, o dito alcalóide não oferece redução perceptível das lembranças e raciocínio, embora as impressões visuais sejam grandemente intensificadas, “recuperando um pouco da inocente percepção da infância, quando o senso não se achava direta e automaticamente subordinado à concepção”, mas ainda assim, gerando uma grande vontade de não fazer nada, passando a considerar injustificáveis a maioria das causas que os fariam agir desta ou daquela forma. “Lesado”, diriam. Huxley, porém, defende que há melhores coisas a se pensar quando sob o efeito da droga.
A segunda bateria de ensaios, O Céu e o Inferno, dividida em pequenos apêndices, dá conta também dos efeitos que a iluminação podem ter sobre alguns indivíduos, revelando aspectos nada agradáveis tanto da psique quanto do modo como o mundo se apresente para este ou aquele. Segundo Huxley, a simples noção de individualização presente em algumas dessas viagens ruins, pode ser o bastante para levar um homem à loucura. Ainda assim, firme em seu propósito de vislumbrar a transcendência (que já havia sido tema de um apêndice no seu estupendo romance Os Demônios de Loudun), Huxley passa a análises curtas, porém bem descritivas, sobre outros fenômenos capazes de gerar experiências semelhantes, tais como a luz estroboscópica e o dióxido de carbono.
Como se vê, as experiências para afugentar o ego e vislumbrar algo além dos limites comuns, ao menos para o senhor Aldous Huxley, são um pouco mais variadas que os limítrofes costumes da civilização ocidental tem nos apresentado. Como mencionado no segundo parágrafo, irônico é que tudo isto tenha se passado nos cinqüenta e sessenta e que, novamente, caminhemos na intenção de transformar tais assuntos em tabu. Respirando fundo por aqui...

sábado, 17 de abril de 2010

outra prévia...


- Nem ferrando que dá pra sair vivo e em paz depois da leitura de Antono Callado, minha uva. Quarup é um livro chave, da mesma espécie caudalosa e borbulhante que o Ulisses de James Joyce. Ou estarei cometendo um pecado? Pecadilho, diria. Callado é muito justo na sua readaptação de uma jornada mitológica no decorrer de uns dez poucos anos, iniciados pouco antes da morte de um Getúlio Dorneles Vargas (com tudo lá, até o tirambaço no pé de Carlos Lacerda e outro, fatal, no major da Força Aérea Rubens Florentino Vaz – confira na Wikipédia, o Crime da rua Tonelero), culminantes com o golpe de 64 – que se estende para muito além das páginas, tudo testemunhado por um protagonista tão inconsciente do seu papel mutatório de si mesmo, tão charmoso em suas dúvidas e perfilado em chão de terra, na Pernambuco de Miguel Arraes, que é como se avalia no livro de reportagens, Tempo de Arraes (com duas edições, uma antes de 64, pela Civilização Brasileira, que o meteu na prisão – onde rabiscou as primeiras linhas do que viria a ser o Quarup, e outra de 79, na abertura, uma cópia que tenho, da editora Paz e Terra, que, coincidentemente, tinha seu conselho editorial encabeçado por Callado, Antonio Candido e Fernando Henrique Cardoso), um livr’reportagem que tinha sido precedido por outro, Os Industriais da seca e os galileus de Pernambuco, de 59, construído em cima de série de reportagens feitas especialmente para o Jornal do Brasil. Acontece que em Tempo de Arraes, Callado já enfia uns dois ou três indivíduos que ele romanceia em Quarup. Ou seja, tudo gente fina, realesca, como os demais que o padre Nando, o protagonista herói-picaresco do livro, começa a encontrar no seu caminho, que se traça em sete partes, das quais, e agora volto a me arranhar com o Ulisses de Joyce, tão heróico, tão num único dia, dieróico, não é de se espantar que eu queira me arriscar, nessa enfiança texto adentro, um orgasmo de linhas. Esporreação de palavras convertidas em 4D, mulher! A realidade entre as linhas de um livro são as únicas que nos cabem. E caçando a realidade entre páginas por que não encontrá-la no quarupizante épico do Callado? E lá está, ao menos para mim, iniciada em sorumbático silêncio de quem só conhece a própria voz e é incapaz de se comunicar com Deus, O Ossuário, primeiro capítulo, de desventuras e andanças não tão pesadas, só imploradas, esprimidas e sangradas e molhadas e manchadas nas cuecas e dentes trincados pela noite adentro, muito teórica, muito muito. Isto tudo para se desprender no capítulo seguinte, O Éter, onde enfiamos pelo nariz todo o exagero que ousamos não pedir, e esperamos uns outros personagens estranhos, uns defendendo que crianças sejam infladas como balões, levadas ao céu no paraíso color-entorpecido dos lança-perfumes, enquanto, padreco Nando já tendo descoberto o sexo, agendamos um anúncio, um pré-acontecimento – este é o intervalo negro, mas não se diz inconseqüente, que culmina n’A Maça, terceiro capítulo, qu’é onde eu estava, e que apesar de ser negro (é nele que Getúlio morre, se morre, morre-se o Getúlio Vargas com uma bala na cabeça), é também transformador, porque ressuscita uma série de modos e maneiras de antanho, du’antes de se fazer necessário ter roupa, do antes de ser preciso fingir e chantagear pelo amor e pela dor, de tão antes que até parece efeito do éter – tanto que Sonia se enfia na mata e não volta, e é bem capaz d’ela ter é morrido junto do seu índio papilão. E é só n’A Orquídea que se pode enfiar depois de tão áspero batizado (que, é claro, só se batiza de verdade um homi que sai dos osso e se enfia pela eteriedade e depois se vira alimento-pecado e se cospe de volta pra brotar em flor ness’mundo), que é onde se procura o centro (Callado, tão sutil, cisma de falar também dessa mística), e te enfia floresta adentro, onde a busca não é o que se pensa, mas a quase-morte que ela causa é real e está lá, e para quem sobrevive, só há o caminho (só há um caminho, é claro), A Palavra, o quinto capitulo, onde a realidade se reconstrói em sílabas e tijolos deixam de ser parte da casa pra se fazer casa, se fazer objeto de valor, conquanto que seja mesmo a palavra que constrói o mundo, que é preciso sacrificar prazer e medo em prol da revolução que ainda não é clara, não é só beleza e desejo e satisfação e alegretes do sexto capítulo, A Praia, que ainda não veio, e que é tão belamente ilustrado, com paredes cheias de palavras (LE-VIN-DO) e quartos e redes e barcos e areias e chãos e puteiros todos cheios tão cheios de bucetas e pancadas e torturas e cegueiras que te jogariam, enfim, n’O Mundo de Francisca, onde o caminho escondido dos santos era o caminho perfeito do pecado, e do adeus, adeus, porque o mundo segue para além das páginas.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Prosa do observatório


Essa hora que pode chegar alguma vez fora de toda hora, buraco na rede do tempo,
essa maneira de estar entre, não por cima ou atrás, mas entre,
essa hora orifício em que se acha acesso ao abrigo das outras horas, da incontável vida com suas horas de frente e de lado, seu tempo para cada coisa, suas coisas no preciso tempo

Isto é Julio Cortázar, retirado logo das primeiras linhas do volume que, homônimo ao título deste post, traz ainda uma série de fotografias batidas pelo próprio Cronópio.
O tempo é algo que se encontra em segundo plano nestes meus Pássaros Artificiais: cada um dos personagens está tão livre das amarras do tempo e do espaço, que só lhes resta passear entre as camadas, observar seus tormentos, suas prisões, suas gaiolas - é como se estivessem perdidos num quadro de Escher, várias cópias deles mesmos se cruzando nas escadas, correndo em todas as direções, aflitos, querendo chegar a algum lugar.
Com sorte, o leitor pode se identificar e, com mais sorte ainda, se lançar na mesma escadaria. Mas, por favor, não me acusem de buscar alguma coisa. Muito menos uma resposta.

terça-feira, 30 de março de 2010

Cut-up


fumando um Carlton Dunhill, enxotando Cinza de Medo que insistia em se enroscar, pareceu-lhe muito agradável como homem, muito gordo, uma figura esquisita, um catador de palavras, que faço neste lugar abandonado dos diabos?, distante da esguia figura burroughsiana que, na bolsa, sobre o topo das anotações, uma máquina de escrever meio quebrada, os dois, mandando numa única noite um metro de cocaína, sem problema, ainda sendo capaz de viver, coisa toda que está se desencadeando por aqui, porque prefiro Drácula à Frankestein, mas comer aquela lindeliciosa ao meu redor – incrível que eu, como na sua visão, falharia completamente em ser da fundação da Orquídea, capim, filho da terra, expelindo catarros, o Garoto Cut-Up, como era apelidado, esfregava os olhos, os filetes de frases se montando, se recriando, espremendo-se mente afora, enquanto ele decodificava em capítulos de Sabrina, Huxley, Cortazar e páginas do Caderno de Esportes, arrancando significativos laivos do futuro que a ponta da caneta é a ponta dum V, uma seta – puxar o gatilho, e deixar-se rebentar que é isso aí, e se enfia, contou também, indo de pó branco inté o fundo do nariz do velho, passar deixando o velhinho ligadão, lembrando da época como administrador, superar antinomias, mas é condenado porque ousou.
Depois, segundo pensa a senhorita Callamand, segue-se uma fase de desmineralização, as enguias se tornam amorfas (mas a linha se quebra no amor), se abandonam às correntes, o verão, compilador de letrinhas, isso é que era o guri, e desperta, e por causa disso o homem está aí cobiçoso, Nietzsche e Joyce, um ou outro olho apodrecido pela dúvida, enguias, dura fé, “e que porra de festa é essa?” “ah, festa de volta, fazer ela viva de novo, bichinha, a chance de fazer lá, amando aliens”, sendo difícil de compreender satisfatoriamente esse papo de encerrar o mundo.
eu também te amo
De olho no cut-up boy, um circuito diferente, rearranjando neurônios, a complexidade das Valquírias, quando longe de serem mercenárias, refazem a oportunidade de escrever sem freios, sem amigos, todos todos, tão felizes, oh oh, tão cá com o demônio e seus brinquedos, ainda escrevendo o que é seu, meu, à serviço do Grupo agora, tesoura presa entre os dedos, cortando páginas inteiras durante todo o dia: - Você não vai – é o que esperam, é o que me pedem.
Zacarias, no ônibus, enquanto viaja, olhos rancorosos, abraços oportunistas, refletindo os assuntos a serem tratados, uma mulher sem punhos, um distribuidor de rações agrícolas. Olhando sem muitos pudores para seus punhos, Zacarias pensou na velha teoria de um amigo que tentado a lhe dar uma mostra de como seria um aleijado, respirou algumas vezes, falou com o filho mais coração e se procurou bem, encontrando-o no útero.
Eles também não te selecionam no fim da viagem, destino único: Götterdämmerung, meu som depois de tocar, indo indo, de um lado a outro, após os insuportáveis insultos de seu mundidentificação, sobre a voz que solicitava entender, o som de uma sanfona, enfim: manhã de natal, as casas que sobraram, é difícil compreender satisfatoriamente, esse papo encheu o quarto para encerrar com o mundo a partir de algumas das suas atividades: masturbação, viciado, transformou o apartamento sem querer saber de maçã porra nenhuma, que essas merdas ninguém na cidade destacava-se pelo prazer ao ócio e pela ira sobre rostinhos ricos e bonitos a fim de se esgotar, que agora já não se quer mais um fumódromo, nem índios querendo ressuscitar troncos, nem maconheiros e esquisitos, mas sim gente que se embeleze para a posteridade.
No fim do mundo do fim do mundo um origami ganha vida e se esconde de alguma tênue forma, conhecendo e se aproximando, olho na rachadura perfeita dos dedos, olho silencioso, catalepeteando uma planta carnívora, brotando totalmente de quem está de fora, de volta, engolindo moscas, para que a trama não entre, não se enfie, absorva somente a mim, encarquilhando-me fantasticamente, completamente pensada, que eu vou me encarregar de justificar alguma ordem na loucura de disco arranhado lhe buscando e pombos.
A confusão era só para pestanejar.
A senhorita Callamand colhe os resultados, entrega à jovem Carolina que, livre dos seus remédios, lê o relatório de cut-up boy, o Garoto Cut-Up, como quem lê uma mão de cartas de tarô, mas antes sai sob o tempo ruim, enche os olhos de poeira, grita para as nuvens escuras e esfregando o nariz espirra um muco verde na barra da saia rosa, que ela esfrega na parede e

“E se ele não quiser ser aliviado destes sofreres?”
acorda na manhã seguinte, quando ela já havia se dado conta de que ambos são ficções sobre não se ter uma casa, não cortar as unhas e viver com cheiro de cachaça

depois, encharcada, volta ao escritório, onde se reporta à senhorita Callamand, anunciando que as coisas começam a desandar e que, talvez, seja a melhor hora para se visitar Macuco ou Pouso Alegre ou Santa Amena ou seja lá que diabos de nome tenha a porcaria da cidade onde Anhangaátoo Therion recruta homens para se transformarem em passarinhos e palavrinhas obscenas e criar o fim do mundo, enfiando-se através das páginas, palavras pelas paredes, fugindo, inventando a formação de um romance de benefícios: a frágil mulher, a feiinha, os empregadores, o que se pode fazer num quarto, tornando-se uma insinuante ciclotimização idiota de tramas que remetam a tudo, desde que não se abra o bico, que as histórias e personagens, como um agulhão, furem, mas não possuam nem costurem, deixando todas as tramas soltas, dispostas à imaginação, escrevendo como quem pinta uma parede de azulejos, pequenos quadrículos de cerâmica, preto e branco, a cada novo azulejo, um santo na parede, manipulando, disfarçando a realidade por toda a sala. Como um grande filtro. Amém.


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breve interlúdio (e prévia), escrita aos moldes da técnica narrativa criada pelo velho William Lee. Um presente para os leitores que ainda se arriscam nesse blog.
Recomenda-se o uso de LSD durante a leitura.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Prévia



O que eu mais gosto de trabalhar com o Antonio, é que ele sempre sabe encaixar muito bem o que eu peço de forma tão amalucada no roteiro, com o que a trama (essa coisinha de muitas pernas, que me foge ao controle) pede por ela mesma.
Isto, é um suspiro após um longo hiato. Em breve, retornaremos com a programação normal.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Andrew Wyeth


O post do dia 04, fazia uma homenagem ao quadro O Mundo de Christina. A pintura, Christina's World, do americano Andrew Wyeth (1917-2009), retratava a prima do artista, Christina Olson, vítima de poliomielite, que tinha de se arrastar por todo o terreno em que vivia para colher os frutos de seu jardim. Tema de uma série de pinturas de Wyeth, Christina vivia em Cushing, Maine. Sua casa, que continua de pé, hoje é conhecida como a Casa de Olson.
Curiosamente, Wyeth não usou Christina como modelo para seu quadro, mas sim sua esposa, Betsy.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Reta final...


... da primeira parte. Após essa página, teremos mais duas que darão por encerrada a primeira forma de leitura de Pássaros Artificiais. A ela, se seguirão outras dezesseis páginas, criando uma segunda forma de leitura e abrindo margens para a principal. Lembrando que já é possível, aos leitores mais imaginativos, criarem sua própria tecitura narrativa.
Ah, esta é a primeira página inédita publicada aqui. Todas as outras haviam sido publicado no A Voz da Serra Light, que deixou de exibir a nossa história em suas páginas, depois que me desliguei do jornal.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

intermission



Chegamos num ponto em que os intervalos entre as páginas terão de ser um pouco maiores, porque alcançamos o ponto de publicação n'A Voz da Serra (que cessou de publicar a hq, desde que encerrei minha participação lá pela redação do jornal). Por isso, segue uma página em seus estágios iniciais, com a arte do Antonio e parte do roteiro da hq referente a mesma.
Continuem nos acompanhando.

Pássaros artificiais
Página 5 (28/5) / 3 linhas

Painel 1:
Cristina e Tadito mexendo nas coisas de Antonio Izabel. O quarto tem folhas, livros, discos, revistas e pedaços de papel espalhados por todos os lados.
Cristina está em segundo plano, agachada próxima a porta – uma porta que dá para um corredor escuro, com mais pilhas e pilhas de papel pelo caminho. Tadito se encontra em primeiro plano, levantando uma pequena pilha de papéis que se encontra sobre uma pilha de discos. Há um envelope ali.

Cristina:
Não venho aqui desde que saí de casa, uns anos atrás.

Cristina (mesmo balão):
Meu avô tinha lançado aquele livro “Just let the baby die (in your head)”.

Cristina:
Minha mãe tinha acabado de perder um bebê.

Painel 2:
Flash back. Vemos a coisa por baixo, como que dos/pelos olhos de uma criança (no caso, os olhos de Cristina). A imagem é deformada – a mãe de Cristina e seu avô, Antonio Izabel. A visão dos dois é uma lembrança distorcida, onde eles berram um com o outro, incompletos, odiando-se (sei que você saberá o que quero dizer).

Quadro de texto:
“Ela achou que foi muita crueldade da parte dele.”

Painel 3:
Cristina segurando uma cópia de “Quando Teresa brigou com Deus” de Alejandro Jodorowsky. Tadito se aproxima dela com o envelope nas mãos.

Cristina:
Pra mim, ele nem sabia que ela estava grávida, antes.

Tadito:
Aqui.

Painel 4:
Cristina colocando o livro sobre a mesa, enquanto pega o envelope das mãos de Tadito.

Tadito:
Isto é seu.

Painel 5:
Cristina tirando três folhas de dentro do envelope.


Cristina:
É o...?

Tadito:
Testamento dele. Pode-se dizer que sim. Ao menos, interpretei dessa forma. É o mais próximo de um presente que seu avô conseguiria deixar.

Painel 6:
Cristina lendo o papel.
Tadito está se sentando sobre uma mesa (seu ombro esbarra num monte de folhas que cede para o lado, caindo no chão).

Cristina:
“Para os meus...”

Tadito:
É como ele falava de vocês.

Agora se segue uma seqüência de painéis onde Tadito se movimenta tentando pegar as folhas, enquanto fala (a próxima linha de diálogo de Tadito será dividida entre os painéis que você achar necessário para fazer essa seqüência).
O caso é que no final, Tadito estará de quatro, no chão, com as folhas espalhadas ao seu redor.

Tadito:
Ele chamava a família dele dessa forma.
Os amigos ele chamava de “Os Nossos”.
Daí, quando li, sabia que era pra vocês.
É o testamento dele pra vocês.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

As frestas do tempo


Pássaros Artificiais, me parece, está sendo uma história difícil de ser digerida por uma boa parcela das pessoas que se aventuram a lê-la. Com exceção de páginas como a em que os personagens aparecem fazendo sexo, ou a do episódio do bebê morto, as reações obtidas, quase sempre, tem sido de desentendimento quanto ao que a história pretende contar. Sinceramente, não entendo tantas interrogações.
A história, admito, não se propõe a fácil digestão. No entanto, isso é muito mais pelo seu tema principal, que é, por sua vez, muito simples: avô morre, garota volta pra casa e tem de lidar com todas as coisas ruins do seu passado, enquanto lida com as dores do presente.
Tem muito filme da Sessão da Tarde e do Super Cine que trazem temáticas semelhantes e todo mundo assiste até o fim, mesmo que seja para dizer que é uma porcaria de história. E, talvez, seja mesmo.
Tenho como protagonistas desta história, pessoas ordinárias, sem nada demais, sem grandes atrativos que não o de estarem vivos, lidando com todas as complexas afeições e degenerativas cargas emocionais que todos nós trazemos. Se há algo de fantástico, espetacular, mágico na trama, ela está no fato de que o tempo, para os personagens, é mutável, não só pelos desvãos de suas memórias, mas pela vontade do leitor, que os conduz através do espaço-tempo de acordo com sua vontade.
É isso, meus amigos. Enquanto olharem as páginas numa velocidade pusilânime, tudo o que terão são personagens emaranhados em cenas, quando devem tratá-los como criaturas passíveis de mudanças. Entendam isso: o poder é de vocês. Caminhem como quiserem, entendam o que quiser. Basta que criem algo mais que as dificuldades do espaço e do tempo, retirem esses véus limitadores que lhes prendem.
E leiam a história, e todas as histórias, com os olhos de um deus novo e com ouro correndo nas veias.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Uma passagem relevante


Vômitos, mensagens cifradas, idéias que vêm e vão... A essa altura, muito já me foi acusado em relação a essa história. De que ela não teria sentido, principalmente. Julgo que tem. Que da forma doentia em que as imagens e informações são aspergidas sobre o leitor, uma trama se delineia, com as complexidades de um quebra-cabeça que clama por ser montado, que se rasga, perverte, confabula, para lá e para cá, na cabeça do público-leitor-desenhista-escritor, todos encafifados, olhando com curiosidade onde é que isso tudo vai dar.
Sobre essa página, mágica na minha opinião, encontramos um feitiço de mudança, um sigilo mágico que não se assemelha ao da anterior, repleto de recortes, embebida em álcool, rancor e necessidade (algo visto em toda a história). Mas há um caminho por aí, posso jurar. Para o bem ou para o mal.
O vômito também é limpeza.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O mundo de Cristina


quede as flores e os mingaus?
É de se esperar uma vida agradável no campo, principalmente a essa altura, em que agradável é sinônimo de arrastar-se pela grama, cada vez mais conhecida, grama minha, buscar o escapável pôr-do-sol, perder-me entre as raízes, conhecendo a grama de todo o quintal, observando-a crescer, bulbo por bulbo através dos buracos da terra que deforma minha forma já disforme, molda-me à resistência daqueles que sofreram e sofrem, faz de mim a santa que não sou aos olhos dos outros – pintam-me, imortalizam minha dor sem conhecê-la e pensam compreende-la como quem compreende que o desejo que brota é infeliz porque se distancia do outro desejo de outrem que sentindo-se mal amado, despeja cores numa tela até expurgar toda a maldição, espalhando-a (a dor) aos quatro ventos, torcendo para que se vá, se vá, enfim. E mal consegue distinguir-se da pintura, agora, perde-se calmamente, com uma falsa serenidade, outro desejo a explodir, toda a dor a se derramar – o não querer ó, o não amar, o se perder, cavando o que não se conhece, porque não está lá, não está lá, não é capaz de sujar as mãos de terra, não pode verificar sob as unhas e ver toda a história toda a casca, toda a maçã mordida – a maçã que contém todo o cosmos, vinda da árvore gêmea. Conhecimento e vida destacavam-se, proibidas no paraíso.
Arrasto-me sobre a grama, sem imaginar-me velha, apenas conhecendo o instante arrasto-me, conhecendo a grama que me deforma, que me forma, que me faz viva.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Da teoria da flor de lótus



Ando incrivelmente sem tempo de escrever por aqui, mas permaneço fiel às atualizações. Fica o papo de que a arte do Antonio é sempre muito bacana.

sábado, 30 de janeiro de 2010

Entre-quadros: rompendo o espaço-tempo



As histórias em quadrinhos oferecem possibilidades maravilhosas para qualquer narrador. De um painel a outro, passam-se anos, diálogos permanecem, misturam-se, e isso sem precisar de brilhantes teóricos de edição, bastando um movimento do olho, uma página virada, e todas as limitações cedem.
Quadrinhos, pelo menos da forma como venho tentando conduzir esta história específica, oferecem muito mais do que tramas focadas em estruturas tradicionais de narrativa, podendo explodir para todos os lados.
Por isso, se em algum momento de suas leituras, começarem a ficar confusos, lembrem-se de que esta hq não se passa num momento específico. Os personagens passeiam pelo tempo e pelo espaço, para cima e para baixo, para frente e para trás, de acordo com o tom que vocês preferirem.
Por enquanto, não quero estragar surpresas, mas conforme as páginas forem surgindo, vamos bater uma bolinha sobre essa pequena maluquice que nos apoquenta e prende, que é a realidade.

Ah, e o Blog dos Quadrinhos citou o Pássaros Artificiais na sua lista do Dia dos Quadrinhos Nacionais.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

“Nada é verdadeiro, tudo é permitido”



A frase, atribuída à Hassan Ibn al Sabbah, o “Velho da Montanha”, é o principal lema dos praticantes da chamada Magia do Caos, que eu não tentarei explicar aqui, em miúdos, do que se trata. Afinal, a grande rede serve pra isso, linkar indivíduos, informações e fatos, que é, de certa forma, o modo como o caos age.
Mas cabe aqui, sobre a sexta página (tão cheia de referências, lembranças sutis, desejos amargos e amores), uma reflexãozinha sobre os objetos e elementos citados nesta história que, claro, tem no caos sua principal força motriz. Tenho cá minhas esquisitas idéias sobre o (des)funcionamento do universo, e de como, por meio de algumas intervenções, podemos, da nossa maneira, alterar os circuitos da Grande Máquina e obter os números certos na loteria dos deuses.
Claro que o Firewall dos deuses é um tanto mais complexo de se lidar e furar, assim, nós pobres hackers, temos é que nos virar como podemos. Uma solução adequada é viver, pura e simplesmente. Mas me parece muito sem graça, fazer as coisas assim, sem catar os desafios pela gola.
Por isso escrevo. É meu vírus pra humanidade. “A linguagem é um vírus”, já dizia o mestre Burroughs. Com o que eu escrevo, não faço nada mais do que manter em ritmo vivo cada uma das minhas obsessões, livrando-me de algumas, ficando preso a outras, buscando soluções de problemas que não estou bem certo quais são. Amores mal sucedidos, mágoas, sentimentos atrofiados que começam a se mexer, estourando para todos os lados... tá tudo aí, nessa caixinha de brinquedos que ainda estamos aprendendo a lidar.
Ah, sentimentos que pedem vazão. Se não mudam, ajudam a mudar o ao redor. De uma forma ou de outra.

E pra quem não conhece, cá vai o grande Patativa do Assaré recitando su´A Morte de Nanã.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Gibis que dão nó

Me vi pensando como seria se a narrativa dos quadrinhos parasse de copiar o cinema e a TV e buscasse alguns recursos da ópera, por exemplo. Que tal quadrinhos densos, carregados de referências, herméticos, que parecem mais poesia do que prosa? Que tal quadrinhos carregados de significados e possibilidades múltiplas, prismáticas? Quadrinhos compostos como música? Em um mercado dominado por séries 'lado esquerdo do cérebro' [que geram reações racionais], achei que seria revigorante oferecer uma alternativa 'lado direito' [reações emotivas].”

Grant Morrison em entrevista ao site Newsrama

Aprendi a ler com quadrinhos de super-heróis, mas foram os autores mais “porra-loucas”, como Grant Morrison, Alan Grant, Alan Moore, James Delano e Peter Milligan que fizeram minha cabeça pra valer. Gente que escrevia quadrinhos com o mesmo fôlego e tesão de Thomas Pynchon, James Joyce ou até Will Self, que não tinham pudores em te catar pela cabeça, “querido leitor”, e te sacudir até ficar tonto, só pra no final, PA!, te chacoalharem os miolos todinhos com uma pancada contra a parede.

Esses me fizeram o tipo esquisito que sou.

Claro, nem de longe me arrogo ser um autor à altura de qualquer um dos grandões citados no parágrafo anterior, mas bem posso ser presunçoso de querer criar minha própria maneira de conduzir as coisas, não? É isso que Pássaros Artificiais é, seguindo bem próximo desta fala capturada do Morrison durante a entrevista que ele deu quando o último (e complexo) número de Crise Final chegou às lojas de quadrinhos americanas.

Quadrinhos pra engambelar a realidade, ao mesmo tempo que lida com tudo que nos inferniza e deleita por aqui. Escapismo pra que?, se podemos encontrar jogos e caminhos incríveis entre as linhas de uma página, as tonalidades de um quadro e os movimentos simples de um bom ator num palco mal iluminado?

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Em tempo: o livro que Cristina aparece segurando é Quando Teresa brigou com Deus, de Alejandro Jodorowsky. O tema do livro, um tratado de redenção familiar, conduz boa parte da minha história, que também se fia na confiança de que os leitores são bem capazes de entender as elipses, os pontos de fuga e os segredos que todos, inclusive personagens de uma hq, podem trazer em suas vidas.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Pragas e feitiços

Ah!, uma das minhas páginas prediletas. Um desafogo que surge no primeiro quadro, recheado da mesma dor que invadia a página anterior, e que segue, sem solução, através dos personagens, confusos quanto às diversas nuances da trama na qual estão metidos, ao que buscam e, no encerramento, uma auto-ironia.
Quão presunçoso sou eu? Está aí, todas as respostas, boa parte dos feitiços e chaves.
O Massula, camaradaço, disse até que esta era uma página que dava o tom da loucura. Se tudo der certo, cada um dos envolvidos terá lá sua quota de satisfação, livre das dores, caprichos e fantasias.
E, se quiserem mais capricho em esquemas e cut-ups, sugiro que leiam Burroughs ou Cortazar. Eu só posso oferecer o caos, cá da minha maneira ordenada e caprichosa (de quem é tão dado a doidices).

domingo, 24 de janeiro de 2010

De escrever com dor


Essa terceira página foi, quando impressa e publicada n´A Voz da Serra, um motivo de apreensão para mim. O poema sexual, escrito por mim, que a acompanha é tão explicito que, infelizmente, quase todos que vieram comentar comigo sobre esta página, estava muito mais interessados em expressar seu descontentamento com palavras bestas e comuns como “meter” e “gozar”, do que falar sobre o conflito de sentimentos presente na barafunda de pensamentos da personagem, seu complexo bailar entre o amor e ódio. Se me perguntarem, direi que estou longe do mau gosto (ainda que tenha uma bela duma tendência ao escatológico e tudo quant´é nojeira), mas não creio que esse poema seja tão ruim ou de mau tom. Acho apenas que ele expõe algo muito comum a todos que se aventurem em algum duelo amoroso, e que por isso é preferível tachá-lo de ruim.

Méritos literários deixados de lado, o fato é que as reações a essa página foram tão adversas, que me fizeram mudar o cronograma original, retirando outras duas páginas em que os personagens transavam, se amavam e odiavam, e dando um novo final à história (puxando duas páginas de um outro modo de leitura). Creio até que foi vantajoso. Arranquei da história, com esse medo de ter a publicação “censurada”, duas páginas e coloquei outras duas que mudaram o tom da trama, me apresentaram um novo caminho, de redenção, não só para os personagens, mas para mim. E, gosto de pensar, que algumas pessoas que acompanharam o desenvolvimento desta minha maluquice, também se beneficiarão desta história.

Falando nisso, e para dar o tom que o título desse post pede, admito que, mais do que possa parecer, essa história se manifestou para diferentes pessoas com sentimentos bem parecidos. Quase todo mundo que leu se mostrou bem incomodado com o clima constante de desespero que parece se apossar dos personagens nesses momentos engaiolados de cada página (Pássaros Artificiais, sacaram?). De fato, como encerrei o post anterior, admito que muito do que escrevi até este momento, foi movido pela dor e por uma garganta que não cessava de engasgar e dar vazão a choros incontroláveis.

Acho que mudei. Ainda escrevo sobre dor, meus amigos. Cá do meu jeito confuso, vertiginoso, que tanto me agrada, mas não carrego mais tanto desse sentimento ofuscante e pesado. Em outro post, mais adiante, explicarei o processo mágico que adotei em relação a essa história, para que as páginas cessassem de me esfaquear e começassem a me oferecer flores. Por enquanto, digo apenas que David Lynch me ensinou uma lição preciosa no livro Em águas profundas, que ele lançou uns dois anos atrás. O diretor de Veludo Azul diz que a dor pouco é dos motivos que nos fazem seguir ou criar. A dor só faz doer. Escrever sobre a dor, não é necessariamente sentir dor, é buscar criar conforto, é oferecer iluminação pelo caminho mais difícil, porque, infelizmente, é o caminho pelo qual a maioria anda optando por seguir.

Nessa eu vou com Lynch e Alejandro Jodorowsky. Vamos criar para sanar, minha gente! Vamos criar para oferecer paz, mesmo que atravessando um mar de bosta.

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Por alguma botoquice do Blogger, hoje foi um sufoco pra colocar uma página no ar. Clique no link presente no texto para visualizar a terceira página em formato maior, e não na própria página, como nos posts anteriores.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

A arte como fenômeno mágico



“A visualização por múltiplas telas aparentemente foi antecipada pela técnica de cortes (cut-up) de William Burroughs. Ele sugeria rearranjar palavras e imagens para escapar à análise racional, permitindo a evasão subliminar de laivos do futuro. Um iminente mundo de estranhezas vislumbrado de relance.”

Alan Moore, Watchmen 11

Digo sem muitos pudores que este gibi, assim, violento como é, foi responsável, senão por me salvar a vida, ao menos por colocá-la em perspectiva. Não só porque tem sido algo que me assombrou por bem mais que um ano, mas também, quando finalmente foi escarrado na direção de se tornar ato realizado, Pássaros Artificiais acabou se tornando, apesar de todos os meus receios, aquilo que ele era originalmente feito para ser.

Como toda história, esta aqui se propõe a expor tudo quanto é horror, vomitar sobre o tapete e cuspir na tela da tv, enquanto se alivia das dores, cria uma nova realidade e, com um tiquinho de esperança, procura jogar o público leitor nesta mesma viagem que; atenção, sempre!, não deve ser lida em linha reta. Talvez, se toparem o desafio, nem mesmo devam ser completamente entendidos.

O que sei é que, só agora, tempos depois de escrito, impresso e, finalmente, sendo levado a público de uma forma que me pareça adequada às suas ambições, Pássaros Artificiais se materializa para mim como um objeto real, que vai além do intrincado código de sinais que tracei, e se joga em alguma espécie de adequação narrativa que pode contar com um público interessado em julgar seus méritos e falhas artísticos.

Bah!, isto é de uma época em que só havia dor. Agora, creio que posso escrever com algum amor

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Semeando possibilidades

Escrita por mim e desenhada pelo brilhante Antonio Eder, a hq que passarei a postar por aqui com intervalos regulares de dois dias, Pássaros Artificiais é uma história criada na intenção de ser lida numa infinidade de ordens possíveis. Ou, pelo menos, uma boa meia dúzia de boas opções.

Embora seja um jornalista (desses que se formaram para exercer a digna profissão de datilógrafo), admito que emendar cá uma sinopse, ou um resumo da coisa toda não é lá muito fácil. Sobre a história, digo apenas que é uma trama de redenção, uma descoberta genealógica.

A investigação e descoberta de uma mitologia familiar é empreendida por Cristina, personagem protagonista desta história que, em meio a uma desgastante relação amorosa que caminha para o fim, é obrigada a voltar para a cidade natal por conta do falecimento do avô.

A história, criada para ser lida em ordens aleatórias, foi (e está sendo) publicada semanalmente no Light, suplemente de fim de semana do jornal A Voz da Serra, em que eu mantenho uma coluna, e no qual atuei como jornalista por quase um ano. No jornal, a história está sendo apresentada pela metade, por opção minha e de Antonio, já que pela fórmula desenvolvida, acreditamos que ela seria plenamente entendida dessa forma. Ou, pelo menos, eu acreditei e o Antonio, louco, entrou na onda.

Vejam bem, a estrutura preparada era de trinta e duas páginas que, publicadas em um gibi comum, grampeado, deveria ser lida de cabo a rabo, e depois, grampos soltos, lida em duas novas ordens pré-estabelecidas: 32-1, 30-3, 28-5... até 18-15, e 2-31, 4-29, até 16-17. A seguir, o leitor que topasse entrar na loucura, que tratasse de colecionar e inventar novas ordens, indo ao cúmulo de traduzir páginas que estivessem em esperanto (algo que não pudemos fazer para a versão de A Voz da Serra), verificar folhas contra a luz e descobrir novas páginas, apagar balões e criar novos diálogos, descobrir outras ligações... e o que mais suas mentes privilegiadas de leitores esquizofrênicos e loucos pudessem imaginar. Ficaria muito grato, alias, que ao fim desta hipotética leitura da versão impressa (que ainda virá), não sobrasse uma única linha do que escrevi, e que tudo mais fosse recriado.

Delírios...

Então, eis que aqui eu e Antonio colocamos no ar a versão publicada no jornal, e que já não é a mesma anteriormente estipulada, por razões que serão explicadas mais a frente, conforme as páginas vão pro ar.

Espero que gostem. Ou desgostem. Ou criem.